Um colega me enviou uma notícia que gostaria de compartilhar com vocês, depois de um longo tempo afastada do blog.
Em Colônia, corre atualmente um processo que ficou conhecido como “Mord ohne Leiche”, ou “Homicídio sem corpo”. Três réus são acusados do assassinato de uma mulher filipina, cujo corpo ainda não foi encontrado. O processo estava em vias de ser concluído, com a condenação dos réus, quando o tribunal tomou conhecimento de que a intérprete havia participado de passeatas pedindo justiça para a desaparecida, distribuído panfletos na entrada do tribunal, é membro de uma associação em defesa das mulheres filipinas e tinha contato com algumas das testemunhas do processo. O advogado de defesa entrou com petição para que a intérprete seja dispensada por conflito de interesses, pedindo que todas as testemunhas sejam ouvidas novamente, já que há suspeita de que não tenha atuado com imparcialidade. A juíza aprovou a petição e determinou que as testemunhas sejam ouvidas novamente, o que exigirá cerca de nove dias adicionais para o processo. A intérprete corre o risco de ter que arcar com parte das custas processuais, que podem chegar a 50 mil euros.
O caso ilustra bem a responsabilidade do trabalho do intérprete em tribunais, que vai muito além do mero comportamento profissional na sala de audiências.
No caso em questão, há alguns detalhes que chamam a atenção. O tribunal e a promotoria não se informaram antecipadamente sobre um possível envolvimento emocional da intérprete com o caso. A intérprete deveria ter chamado a atenção do tribunal para o fato de ser ativa na defesa dos direitos de mulheres filipinas. Em vez disso, ela se mostrou surpresa com a reação do tribunal e afirma que vive numa “sociedade livre” e tem o direito de expressar sua opinião, argumentando que agiu corretamente durante os depoimentos, interpretando fielmente todos os testemunhos prestados.
Não sei o que vocês acham, mas a história me fez lembrar de uma decisão que tomei há vários anos, quando servia de intérprete para hospitais em Stuttgart. Era um trabalho que me dava pouco retorno financeiro, mas que fazia por achar que estava prestando uma ajuda às muitas famílias que não conseguiam se comunicar, talvez justamente nos momentos mais difíceis de suas vidas, com um ente querido doente. Era um trabalho honroso, mas difícil e que me deixava sempre um pouco abalada, pelos dramas presenciados. Um dia, depois de interpretar em um caso particularmente triste, do qual saí aos prantos (eram eu, os médicos, a família, todos chorando), resolvi não continuar e passei a recusar esses serviços. Cheguei à conclusão de que não estaria em condições de ajudar ninguém, pois não conseguia manter a distância necessária para isso. Acredito que se um dia tivesse que ser intérprete no caso de alguma brasileira assassinada, envolvendo pessoas que eu talvez conheça, estaria numa situação semelhante e preferiria recusar e me envolver de outra forma.
E vocês, o que acham?
Se quiserem ler as notícias sobre o caso (em alemão), cliquem aqui ou aqui.